30 de dezembro de 2020

Love and Monsters (2020)


Quando em 2010, a série The Walking Dead mudou a forma como o cinema e a televisão abordaram os zombies, o seu rescaldo ainda é um que está a ser fortemente sentido e difícil de livrar na última década, muito devido à saturação do género. Da mesma forma que Sangue Quente fez o seu sucesso na sua comédia a roçar na paródia, Love and Monsters, realizado por Michael Matthews, vem para desanuviar dos panoramas pós-apocalípticos.

Quando um asteróide em direcção à Terra é destruído, as consequências dos misseis utilizados condenaram os nossos habitantes, quando a chuva química provocou que todos os animais selvagens sofressem uma mutação, tornando-os em monstros gigantes. Acompanhamos Joel (Dylan O'Brien), um jovem que vive numa colónia, protegido pelo grupo que lhe acolheu durante estes incidentes, mas separado há sete anos da sua namorada Aimee (Jessica Henwick). Nisto, Joel decide embarcar na aventura da sua vida, ao viajar 85 milhas até à colónia de Aimee, onde a morte está à espreita.


Este é possivelmente um dos melhores papéis de Dylan O'Brien desde Teen Wolf, num ambiente onde o actor é capaz de balancear perfeitamente o seu charme casual e cómico, ao mesmo tempo que é capaz de manter uma boa postura durante toda a acção e aventura, trazendo o melhor dos dois mundos dele; ao qual se junta Boy, um cão muito simpático, da qual criam uma ligação muito forte e que dá outro impacto a este filme.

O argumento, escrito por Brian Duffield (The Babysitter) e Matthew Robinson (Dora e a Cidade Perdida), demonstram ser o par perfeito para criarem um universo o sentido de aventura e o sentido de humor estão equilibrados, ao qual é importante destacar que a narrativa é um excelente exemplo da estrutura clássica da chamada "Jornada do Herói", podendo ver aqui um crescimento claro da personagem principal.


Se não existe maior motivação que o amor, por outro lado, os monstros jogam ao mesmo nível, sentido cada confrontação como uma batalha de grande importância, capaz de ameaçar a vida e o rumo da história, onde vemos Joel a aprender e aplicar as suas capacidades com cada uma que tem que ultrapassar

Assim, Love and Monsters é uma comédia aventureira, a levar a vida com alguma levidade, onde a acção intensa e os risos calorosos oferecem espaço para respirar e, acima de tudo, divertir; enquanto aborda a sua narrativa de uma forma sólida, numa viagem autêntica em vermos um zero a tornar-se no derradeiro herói.

No meio disto tudo, ainda é capaz de ser mais interessante do que a adaptação de Monster Hunter...

Nota Final: 4/5

28 de dezembro de 2020

Shithouse (2020)


Fazer um filme não é uma tarefa fácil, ainda mais expor uma história que é intensamente pessoal e traduzir isso em algo que sequer se assemelhe a algo próximo de cinema. Mas, de alguma forma, Cooper Raiff atirou-se cegamente ao desafio ao escrever, realizar e protagonizar a sua primeira longa-metragem, Shithouse.

Alex (Raiff) é um estudante numa universidade, sentido-se sozinho e afastado de tudo e de todos durante o seu tempo por lá. Uma noite, ele conhece Maggie (Dylan Gelula), uma residente assistente na residência universitária que teve um dia péssimo e lhe convida para passarem tempo juntos. 


Mais que tudo, Shithouse é a representação de todos os introvertidos e outros afins, incapazes de fazer conexões activamente pela faculdade, sobretudo se for um ambiente totalmente novo. Existem milhares de Alex pelo mundo no mesmo caso, abrido desde já o jogo perante o tipo de vida que o jovem vive diariamente. O elemento de novidade, em forma de uma rapariga bela, que acaba por surgir um pouco do nada, é uma demonstração em como a vida não-planeada, composta por momentos espontâneos, acabam por ser aqueles que nos fazem sentir mais felizes. 

A direcção de fotografia de Rachel Klein, mostra toda a experiência de uma relação universitária na sua forma mais verdadeira e genuína, intimista e que expõe os medos de qualquer relação, entre duas pessoas que inesperadamente se encontraram. É um amor como muitos, onde Cooper Raiff explora de forma coerente a simplicidade aparente da sua premissa, que podemos admirar como um exemplo de como as coisas acontecem por alguma razão.


Ainda que por vezes caia nas trupes do costume, levadas a cabo pelas comédias românticas da geração actual, é todo o texto de diálogos que faz com que Shithouse se destaque dos outros demais, onde cada frase marca a narrativa, junto com uma pitada de comédia, onde não falta sequer uma referência a De Repente, Já nos 30!

Com isto, Shithouse é uma obra onde vemos Cooper Raiff a revelar-se como uma dos grandes estreantes do ano, num filme que grita alto para todos aqueles que estão apenas a tentar viver, à procura daquela experiência única que lhes irá mudar para sempre as suas vidas. Jamais ousando seguir por clichés, por vezes a perspectiva da vida real é mais que suficiente para contar uma história que vem de um lugar próximo, onde conseguimos ver Raiff e Gelula de alma e coração cheio.

Nota Final: 4/5

The Cleansing Hour (2020)


Quando em 2016 a dupla Damien LeVeck e Aaron Horwitz impressionaram os fãs do cinema de terror com a sua curta homónima, integrante do programa de curtas do site da especialidade Bloody Disgusting, foi muito fácil ver que aquela história tinha muito mais para contar. Demorou cerca de três anos até que The Cleansing Hour chegasse agora numa longa-metragem, onde a espera parece ter valido muito a pena.

Father Max (Ryan Guzman) é um "padre" que fazer "exorcismos" ao vivo via as suas livestreams, com uma legião de seguidores muito fiel e fanáticos pela sua missão religiosa. Afinal, Max está a salvar pessoas dos seus demónios; mas na verdade não passa de uma fraude narcisista em busca de fama, com uma plataforma que não passa a nada mais que mero entretenimento, criado juntamente com o seu melhor amigo Drew (Kyle Gallner). A certo dia, o que era suposto ser apenas mais uma transmissão torna-se no pior pesadelo de qualquer um, quando a "vítima" é Lane (Alix Angelis), namorada de Drew, que é possuída por um verdadeiro demónio, testando ao limite o seu espectáculo.


O que poderia ser apenas mais um filme com exorcismos, nada podia preparar-nos para o que vinha, tomando de assalto qualquer preconceito que tenhamos com este sub-género de filmes, onde o demónio é verdadeiramente assustador e, através de uma multitude de truques na manga, mostram muito bem a forma que LeVeck e Horwitz expandiram a sua curta-metragem para um dos melhores filmes do ano.

Max tem uma hora para mostrar aquilo do que é realmente feito, à mercê de um demónio que está disposto fazer refém uma rapariga inocente, sem escrúpulos ou medo, numa obra repleta de diálogos intensos e onde o terror chega-nos debaixo da pele. Até a abordagem da exploração do tópico das redes sociais, que frequentemente não passam da futilidade do que realmente são, é em The Cleansing Hour utilizado para causar dor e sofrimento ao impostor.

Mesmo quando o filme envereda por outros caminhos, estes mais dentro da investigação, que se assemelham ao melhor episódio de Caçadores de Demónios de sempre, este é capaz tornar todos os elementos em verdadeiros momentos de um sonho muito mau, sem o mínimo de esforço.


Ainda que por vezes os efeitos especiais parecem estranhos, não é suficiente para arruinar a experiência, sobretudo com um elenco que cumpre e bem os seus papéis; mas é Alix Angelis quem leva o prémio pelo desempenho multi-facetado e aterrador.

Com isto, The Cleansing Hour é um dos melhores exemplos em como tornar um conceito provado em algo que vai muito para além das expectativas, virando ao contrário todos os clichés esperados deste tipo de filme, provando que com alguma originalidade é possível surpreender e deixar-nos com um medo muito verdadeiro.

Nota Final: 5/5

Spontaneous (2020)


Brian Duffield é talvez um dos argumentistas do qual deveremos prestar muita atenção nos próximos anos, tendo escrito The Babysitter e a sua sequela para a Netflix. Desta vez, o mesmo estreia-se na cadeira de realizador com Spontaneous, levando mais uma vez um misto de terror com comédia, de uma forma que apenas ele sabe fazer; inspirando-se num livro de Aaron Starmer.

Mara (Katherine Langford) é uma estudante do liceu que não sabe bem como quer continuar a sua vida, mas vê-se forçada a mudar de perspectiva quando os seus colegas de turma começam a explodir espontâneamente, sem qualquer explicação. Aterrorizada, ela e a sua amiga Tess (Hayley Law), começam a lidar com o fenómeno estranho, onde pelo meio Mara encontra o amor com Dylan (Charlie Plummer), que perante os eventos, decidiu arriscar em exprimir os seus sentimentos.


Na verdade, Spontaneous nunca se contém quando quer ser horrífico, com baldes de sangue a serem explodidos sem meias-medidas, onde a sua natureza obscura é coberta por diálogos repletos de comédia negra, que apesar que não serem politicamente correctos, têm uma tendência de serem hilariantes; pelo menos durante toda a situação, da mesma forma que as coisas podem ficar muito assustadoras, com fluidos corporais e bocados de carne humana por todo o lado!

No entanto, pelo meio está uma belíssima história de amor adolescente, que frente à tragédia, são motivados a aproveitarem cada momento ao máximo, onde piadas sarcásticas são expressões amorosas, que na verdade apenas servem de cobertura para sentimentos de medo e solidão, num equilíbrio natural. Mesmo durante uma altura mais conflituosa, onde o riso parece não conseguir superar os sentimentos de negatividade, Spontaneous consegue manter o seu espírito vivo e contagiar-nos com a esperança que tudo se vai resolver, duma forma ou doutra.


Se por um lado a dupla de Langford e Plummer fazem um par perfeito, é com o argumento e realização de Duffield que o filme é elevado a um estado novo, onde literalmente tudo pode acontecer; e quando acontece, é capaz de nos deixar a rir ou inundar os nossos pensamentos com tristeza, gerindo incrivelmente bem a inteligência emocional que quer passar.

Assim, Spontaneous é uma das grandes surpresas de 2020, demonstrando-se como um esforço genuíno em mostrar que no meio de tanto medo e incerteza, é possível encontrar alguma luz e esperar que tudo corra pelo melhor; e se for preciso rirmos um pouco para não chorar, tanto melhor.

Nota Final: 4/5

23 de dezembro de 2020

No Escape (Follow Me) | #SemSaída (2020)

Vindo da eterna saga do cinema de terror pós-moderno, onde a Internet e as redes sociais têm que, de alguma forma, ser o centro da tecnologia utilizada para causar medo, vem #SemSaída (com hashtag incluído e tudo), escrito e realizado por Will Wernick.

O filme conta a história de Cole (Keegan Allen), um pseudo-YouTuber que irá celebrar o seu 10º aniversário de carreira com uma surpresa numa viagem que o leva até à Rússia. Com ele está os seus amigos Erin (Holland Roden), Dash (George Janko), Thomas (Denzel Whitaker) e Sam (Siya), que o levam até um escape room, o que esperam ser uma das experiências mais únicas de sempre, uma promessa que Cole nunca irá esquecer.


Ignorando o facto que Wernick realizou um filme sobre um escape room em 2017 - titulado Escape Room e não confundir com o Escape Room de 2019, este realizado por Adam Robitel - é de estranhar que volte a bater na mesma tecla, num ambiente demasiado semelhante para ser coincidência. Ou afinal, Wernick está numa missão de adaptar para cinema as inúmeras experiências proporcionadas pelos escape rooms do mundo. Mas muito disto não bate certo.

A dada altura, um dos grunhos russos diz aos nossos amigos "por mais verdadeiro que possa parecer, vocês estão em segurança", como se uma frase tão dramática não fizesse soar alarmes na cabeça de qualquer um. Levando isto e junta-se uma ingenuidade estúpida, quase estereotipada, de um certo tipo de YouTuber que tanto amamos odiar; e, na verdade, Cole é mesmo muito estúpido. Ou pelo menos assim o aparenta, pela forma que navega pelos puzzles mortais.

Mesmo quando o filme tenta impressionar com as suas reviravoltas óbvias, o facto de nem sequer se esforçar a fazer algo minimamente original é desapontante, ao ponto de quase gritar "plágio" a cada 5 minutos.

SAW e Hostel ficariam muito tristes ao verem o que as suas obras acabaram por inspirar, com #SemSaída a roubar descaradamente do mesmo género de filmes que deseja homenagear ou sequer mostrar influência. Até SAW, que acabou por criar todo um universo de sequelas, descaindo para um contexto nonsense do cinema comercial, mantém a sua integridade com a sua coerência e capacidade de reconhecer que não basta só fazer número. De alguma forma, nem a Blumhouse tocaria neste filme, nem com um pau de 5 metros.

E nós já vimos a Blumhouse a fazer coisas muito más. Minimamente toleráveis. Mas más...

Nota Final: 0.5/5 (originalmente 1/10)

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Originalmente publicado em Central Comics a 23 de Dezembro de 2020.

9 de dezembro de 2020

Jiu Jitsu (2020)


Em 2017, Dimitri Logothetis, realizador conhecido pelos seus filmes Kickboxer; juntamente com Jim McGrath, lançaram a novela gráfica que representasse a sua carta de amor perante as artes marciais que tanto amam. Bastaram três anos até que uma adaptação cinematográfica de Jiu Jitsu, liderada pela mesma dupla, chegasse ao grande ecrã.

Quando Jake (Alain Moussi), um guerreiro com amnésia regressa ao seu ponto de partida para lutar contra um poderoso alienígena, Brax (Ryan Tarran), este terá que contar com o resto do seu clã de lutadores profissionais, entre eles Kueng (Tony Jaa), Harrigan (Frank Grillo), Forbes (Marrese Crump) e Carmen (JuJu Chan), para o derrotar. Pelo meio, também está Wylie (Nicholas Cage), que é o grande mestre no meio disto tudo.

Se a premissa soa tão nonsense quanto aparenta, é porque Jiu Jitsu é exactamente aquilo que esperamos dele: quase duas horas de lutas coreografadas com alguns elementos de qualquer coisa semelhante a ficção científica, ou algo do género…


Olhando para o elenco, este composto quase todo ele por actores com experiência comprovada fora do cinema nas artes marciais, inclusive Tarren, que recentemente foi considerado como um dos melhores duplos da actualidade, temos Nicholas Cage a fazer de Nicholas Cage como se fosse uma personagem tipo Raiden de Mortal Kombat, mas com um orçamento mais limitado. No entanto, ver o actor a pseudo-lutar é uma experiência de deixar qualquer um a querer desviar o olhar do desastre que está perante nós.

Naturalmente, o filme acaba por ser tolo na sua íntegra, com coreografias visivelmente artificiais e com momentos de câmara lenta e efeitos visuais a um nível de filme de estudantes. Jiu Jitsu até tenta abordar a ideia de cenas vistas na primeira pessoa, relembrando-nos que elas funcionam tão melhor nos videojogos que nos filmes.


É triste vermos talentos como estes a serem gastos num filme aleatório, com uma futilidade cujo respeito pela modalidade é quase nula, sobretudo quando existem exemplos que promovem de uma forma mais interessante e criativa as artes marciais, como Gareth Evans, que já trabalhou com Tony Jaa no brilhante The Raid – Redenção, provando que é possível oferecer algo incrível dentro do género, para além dos filmes básicos que continuam a invadir os videoclubes, protagonizados por actores que recusam a ideia de reforma.

Jiu Jitsu não é mau, é terrível. É um terrível no sentido que é divertido vê-lo falhar miseravelmente a tentar ser algo mais do que é. Há o adicional de, se chegarmos ao fim, esperamos receber algum tipo de recompensa, nem que essa seja um pontapé na cara por qualquer um destes actores e artistas marciais. Fora isso, a única coisa que se perde é tempo, sendo mais interessante reunir estes talentos todos num ringue.

Nota Final: 1/5 (originalmente 2/10)

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Originalmente publicado em Central Comics a 9 de Dezembro de 2020.