22 de dezembro de 2018

Under The Silver Lake | O Mistério de Silver Lake (2018)


Quando David Robert Mitchell reinventou o cinema de terror em 2013, com Vai Seguir-te, pouco sabíamos o que o cineasta tinha em mente. Sendo o filme ainda actualmente falado por fãs do género, o mesmo decidiu pôr à prova o seu talento de fazer um filme noir num tempo moderno, e eis 4 anos depois temos a sua mais recente trabalho, O Mistério de Silver Lake.

Los Angeles, a chamada Cidade dos Anjos. É também a cidade onde os sonhos, a futilidade e as teorias de conspiração vêm ganhar vida, onde literalmente tudo pode acontecer sem ninguém estranhar. Conhecemos Sam (Andrew Garfield), um rapaz inteligente mas que não encontra nenhum propósito na vida, isto até conhecer Sarah (Riley Keough), uma misteriosa rapariga que deixa Sam apaixonado, mas que desaparece sem rasto.


Numa missão em busca de saber onde está Sarah, Sam vê-se numa aventura que jamais irá esquecer, com mil e um detalhes que lhe passam ao lado e personagens estranhas que só poderia encontrar nesta terra de sonhos.

David Robert Mitchell agarra novamente na ideia da alegoria e aplica-a numa narrativa que tem paralelismos daquilo que conhecemos sobre a vida em Hollywood, onde todos querem ser alguém a todo o custo. Não há nada que este filme não aborde, desde da religião, à cultura pop e a sua influência sobre os consumidores comuns, que não têm noção que os seus sentimentos são fabricados por poderes superiores, numa base ideológica que bem poderia ter sido imaginada por George Orwell.

É com zero receio que o filme vai aos limites mais estranhos do cinema, com uma estrutura narrativa onde tudo tem uma razão de ser, nunca tendo medo em utilizar a loucura para justificar a sua lógica, ou falta dela, trazendo ao de cima um profundo sentimento de descoberta e curiosidade. São muitos poucos os filmes com a capacidade de deixar o espectador intrigado e uma necessidade desesperante em ver o que vai acontecer a seguir, mas O Mistério de Silver Lake voa muito mais longe daquilo que poderíamos imaginar.


É com uma cinematografia incrível ao qual somos brindados por toda esta viagem, onde cada enquadramento tem detalhes suficientes para garantir futuros visionamentos à procura de outras pistas que possamos ter perdido pelo caminho; ao qual se junta mais uma fantástica banda sonora por Disasterpiece, que faz novamente um excelente trabalho após ter trabalhado em Vai Seguir-te. Nisto, todo o ambiente noir que faz este mistério memorável, é criado somente pela sua capacidade de cativar a nossa atenção não dividida, e recompensar-nos por isso, com um dos melhores filmes do ano.

É curioso ver como David Robert Mitchell traz de volta o seu primeiro filme, The Myth of The American Sleepover, neste novo contexto. Não deixa de ser interessante esta introspectiva por parte do criador deste mesmo universo, deixando no ar se ele próprio é uma vítima do seu sucesso e, subsequentemente, das teias de Hollywood.

Por outro lado, Andrew Garfield deixou de ser o aracnídeo favorito de toda a gente para ser o anti-rapaz-dos-sonhos das raparigas. Com ele estão outras personagens relativamente bizarras, com guarda-roupas a condizer às suas personalidades fúteis, que apenas mostram o seu objectivo em serem as próximas estrelas no Passeio da Fama.


Com isto, O Mistério de Silver Lake é um filme que vale muito pela experiência que proporciona, quase aos níveis de vermos pela primeira vez O Grande Lebowski ou, na ponta oposta do espectro, Matrix. Certamente é um filme que implora ser visto múltiplas vezes, para procurarmos todos os símbolos escondidos nele. Ou afinal é tudo uma grande charada, que vai em conta tudo aquilo que o filme representa, provando que estamos mais obcecados por encontrar o significado da vida, invés vivê-la ao máximo dentro das nossas humildes possibilidades. É assim que David Robert Mitchell eleva a fasquia, dando mais um passo em frente em direcção de garantir ser um dos melhores cineastas do século XXI com o que será sem dúvida um filme de culto.

Nota Final: 5/5 (originalmente 10/10)


Originalmente publicado em Central Comics a 22 de Dezembro de 2018.

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